terça-feira, fevereiro 24, 2004

Vertebrados versus invertebrados

Quando um dia indagava do que era a existência, a razão de ser, o sentido da vida, teria eu uns vinte anos, a única imagem que se me afigurou, já madrugada adentro, foi um abismo, um buraco na história. Coisa apenas provocada pela ausência dos personagens maiores. Coisa que eu também quis para mim. Desde esse dia, passei eu a medir a importância do ser com o vazio que se deixa quando insistimos em abandonar o corpo material.

O sedentário insiste em dar-me presentes como se os meus dias arredados do blog inquietassem a alma dos meus amigos. Sinto-me lisongeado por o pequeno vácuo a que me vou vendo obrigado pelo meu anjinho obrigar à ameaça. Obrigado, Grande Carlos.

Há muito que eu queria escrever sobre uma coisa simples, das mais pequenas como diz acima. O título poderia ser: Como eu descobri que Portugal é um país de pequenos.

As coisas tendem para mim a ser simples e a decorrer com os momentos, os processos, os dias. Dei-me eu conta de que muitas vezes a arrogância toma as rédeas das relações entre pessoas. De forma quase natural, quem ordena assume posturas de prima donna. Só há poucas semanas percebi a pequenez em que vivem essas pessoas acabrunhadas e mal dispostas. Aquele que descarrega a sua prepotência sobre o mais fraco - além de demonstrar a mais pura cobardia, porque sabe que não deve esperar reacção - é na realidade um ser constrangido, que se sente inferior. Ou, no mínimo, que já se sentiu inferior. Porquê? Muito simples, essas pessoas não agem de ânimo leve. Sabem exactamente o efeito que vão provocar em quem amesquinham. E por que o sabem? Porque eles, no seu lugar natural já o sentiram e o sentem sempre muito provavelmente. São eles, de facto, quem é pequeno e apequena este Portugal. Procuram instigar esse medo curto de dignidade porque eles próprios estão por sua vez constantemente submetidos à sua hierarquia, essa hierarquia raquítica que impede e imobiliza e apenas permite a passagem de testemunhos de angústia nessa cadeia que tudo alimenta menos a civilização.

Disto salva-se o homem, tantas vezes comum, que se mantém erecto de coluna, e isso não se aprende nos palácios, nos nomes de consoantes dobradas ou nos títulos das academias. Ser inteiro depende da nobreza de cada um, como nos pugilistas, depende de ter um coração grande. Mesmo quando estamos no canto, nas cordas ou a ir ao tapete.

É isto o que eu penso. E todos os dias me pergunto se o que eu penso é o que sou.

Um abraço e até logo

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